
Em resposta ao texto
A mulher que não queria amar. de Brunno Leal (http://bit.ly/cpLOhJ)
Não é que não quisesse, ela já sabia como funcionava todo o processo. algumas vezes antes ela tinha experimentado a parte estragada da coisa. no começo o sabor agrada e é diferente para cada pessoa. as vezes é doce, as vezes um pouco ácido, nao importa. a verdade é que é bem diferente de qualquer outra coisa já experimentada antes. o sabor
dele surpreende, é exótico. sabe aquela sensação de querer uma comida que não existe? então, é assim.
o amor é gula. e ela já tinha encontrado por duas vezes essa comida desconhecida que não se vende em mercados comuns. aliás, de comidas que não se vendem. podem amadurecer como uma fruta ou até mesmo surgir assim, do nada - comprovando a já descartada teoria de geração espontânea - mas nunca se vendem. o mais divertido é que o sabor modifica com o tempo, as vezes com um toque azedo da laranja em meio ao doce-amargo do chocolate, e a combinação é ainda mais sensacional.
o amor vicia. as vezes tem-se overdose e as pessoas morrem de tanto sentir.
o amor é doença. e talvez a ressuscitação não seja tanta loucura, afinal, se no dia seguinte as pessoas continuam vivas.
o amor que é a loucura. e por mais que não se perceba,
o amor também é álcool, que nos alegra devagar ou nos derruba em poucos minutos. mas o que ninguém acredita, durante o processo de degustaçao, é que, no final, ela bem sabia disso, o gosto enjoa, a fruta estraga, a sensação de querer uma comida que não existe está de volta e a overdose causa estragos maiores.
o amor é ressaca e cicatriz.
Quando se passa por isso a primeira vez, dói, mas tem-se a crença, mesmo que tudo indique o contrário, de que na próxima vez o sabor será melhor e não provocará nenhum tipo de destruição. todos nós gostamos de acreditar nisso e continuará assim.
Mas ela passou por isso uma vez, acreditou e passou por isso uma segunda, e doeu ainda mais, causou ainda mais destruição. não havia mais um chão em que se apoiar e ninguém ligava para isso, era uma dor dela e só. só ela sofreu.
E aí foi o tal momento. ela percebeu que tudo que é demais faz mal e
o amor é demais. tudo que é vício impede o equilíbrio.
o amor vicia e desequilibra. ela resolveu abrir mão da primeira impressão, do sabor incomparável que se sentia nos primeiros momentos, ela abriu mão do intenso para não ter que passar de novo por algo que ela não suportaria. ela se bloqueou de tal maneira que podia dizer a si mesma que se tornasse insensível. e ela disse. ela não queria se envolver, não queria gostar de qualquer um que fosse, não queria mais se importar. e foi o que ela fez. era fraca, sim, não queria arriscar toda a sua vida num sabor novo, independente do quão deslumbrante ele fosse. Sabia que alguma hora o gosto seria decepção e só. e o gosto da decepção pode durar mais e ser mais forte do que o do próprio amor.
Por fora diz que não o quer, mas sabe que só está esperando alguém que se importe com ela de tal maneira que não acredite na intransponibilidade das barreiras que ela criou e fique ali até que consiga derrubá-las, independente do tempo que isso possa levar ou do esforço despendido. tudo que ela quer é o equilíbrio. se ela não acredita mais no amor, precisa de alguém que acredite tanto nele que a faça acreditar um pouquinho mais também, não muito, só o suficiente. um pouco de sensibilidade de volta e ela esquece o desgosto que possuem os finais. ou se não o esquece, pensará que o risco vale a pena. e se as lágrimas forem inevitáveis, no fim, saberá que tal pessoa merece cada uma delas. não é fácil encontrar alguém que mereça um choro, é triste sim, mas é quase um presente merecê-los.