era a incógnita pura aquele olhar que ele me lançara. parecia uma mistura de sensações tão perto da homogeneidade, que isolá-las uma a uma seria de uma dificuldade tremenda, me restavam somente as hipóteses.
o menino estava ali, deitado no meio da escadaria de uma ruazinha qualquer. estava de tal forma jogado que parecia nao pertencer a lugar nenhum, a familia nenhuma, só pertencia a ele mesmo e a toda aquela fusão de sentimentos que guardava para si. provável que nem ele mesmo sabia diferenciá-los, por isso se encontrava tão fora do mundo naquele momento.
a cada degrau que subia, mais eu nao sabia que reação deveria ter. a cada degrau, mais culpa eu ia sentindo por nao correr até ele e dizer qualquer coisa que pudesse tirá-lo um segundo daquele transe.
A única atitude que tomei foi olhar pra ele, nao consegui fazer nada nem um pouquinho mais nobre ou útil. Eu só olhei e encarei seus olhos, tão transparentes da bagunça que estava por detrás. E ele me encarou também.
Nunca me senti tao desequilibrada com o olhar de alguém como daquele menino.
Era muito doce, mas tinha tanta angústia quanto, tinha tristeza e súplica e mais ainda sinceridade, tinha dúvidas e algum tipo de calmaria, só nao tinha medo.
Aquele olhar era toda a minha própria essência, talvez por isso que tenha me marcado tanto.
Eu nao parei para perguntar se o menino estava bem, egoísta que sou, continuei subindo os degraus, mais e mais culpada.
Eu me perdi naquele olhar do menino e prendi ele dentro de mim.
a diferença é só o medo que eu sinto sempre e o egoísmo que me invade as vezes.
(e a minha forma torta de me redimir)