"Sou, em grande parte, a mesma prosa que escrevo. Desenrolo-me em períodos e parágrafos, faço-me pontuações, e, na distribuição desencadeada das imagens, visto-me, como as crianças, de rei com papel de jornal, ou, no modo como faço ritmo de uma série de palavras, me touco, como os loucos, de flores secas que continuam vivas nos meus sonhos."
B.S.



quarta-feira, 17 de março de 2010

[o menino da escada]


era a incógnita pura aquele olhar que ele me lançara. parecia uma mistura de sensações tão perto da homogeneidade, que isolá-las uma a uma seria de uma dificuldade tremenda, me restavam somente as hipóteses.
o menino estava ali, deitado no meio da escadaria de uma ruazinha qualquer. estava de tal forma jogado que parecia nao pertencer a lugar nenhum, a familia nenhuma, só pertencia a ele mesmo e a toda aquela fusão de sentimentos que guardava para si. provável que nem ele mesmo sabia diferenciá-los, por isso se encontrava tão fora do mundo naquele momento.
a cada degrau que subia, mais eu nao sabia que reação deveria ter. a cada degrau, mais culpa eu ia sentindo por nao correr até ele e dizer qualquer coisa que pudesse tirá-lo um segundo daquele transe.
A única atitude que tomei foi olhar pra ele, nao consegui fazer nada nem um pouquinho mais nobre ou útil. Eu só olhei e encarei seus olhos, tão transparentes da bagunça que estava por detrás. E ele me encarou também.
Nunca me senti tao desequilibrada com o olhar de alguém como daquele menino.
Era muito doce, mas tinha tanta angústia quanto, tinha tristeza e súplica e mais ainda sinceridade, tinha dúvidas e algum tipo de calmaria, só nao tinha medo.
Aquele olhar era toda a minha própria essência, talvez por isso que tenha me marcado tanto.
Eu nao parei para perguntar se o menino estava bem, egoísta que sou, continuei subindo os degraus, mais e mais culpada.
Eu me perdi naquele olhar do menino e prendi ele dentro de mim.
a diferença é só o medo que eu sinto sempre e o egoísmo que me invade as vezes.
(e a minha forma torta de me redimir)

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