"Sou, em grande parte, a mesma prosa que escrevo. Desenrolo-me em períodos e parágrafos, faço-me pontuações, e, na distribuição desencadeada das imagens, visto-me, como as crianças, de rei com papel de jornal, ou, no modo como faço ritmo de uma série de palavras, me touco, como os loucos, de flores secas que continuam vivas nos meus sonhos."
B.S.



terça-feira, 29 de março de 2011

[disforme]

musica que as vezes atrapalhava, alegria que as vezes nao vinha, sensibilidade um pouco falha, era como se definia. sorria cada vez que respirava, porque aprendeu que era isso a felicidade. achava graça até mesmo na tristeza, admirava seu rosto no espelho, enquanto chorava, tentando entender se era real ou capricho próprio. fingia tudo aquilo que nao sentia, para os outros e para ela mesma, quando precisava que alguem acreditasse nela. vivia de afirmaçoes alheias sobre sua felicidade tão óbvia e falsa. felicidade. era um sentimento forte, superior aos outros, quase uma filosofia. ela tinha uma mistura de tudo aquilo que a fazia sorrir dentro de si, e excluia, cuidadosa, todo o resto, separando-os em comodas, armarios e lixeiras, em diária arrumaçao interior. o problema menor, que crescia em escala alarmante, era o que fazer com o lixo acumulado. o tapete já disforme, nao aguentaria mais lixo sem que o cômodo mostrasse sinais de bagunça a quem por acaso viesse adentrar-lhe. e ela nao podia correr esse risco, sobreviver dependia de tais aprovacoes. vez ou outra precisava guardar o lixo em alguma prateleira escondida. nao sorria mais a cada respiração e isso a matava um pouquinho. nao estava alegre agora. e cada musica que tocava no quarto evidenciava o tapete meio deformado, mas que continha toda uma essencia que ela nao podia se desfazer.

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